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      Na Minha Secreta Área
      Luís Rocha Rodrigues
      2018/05/14
      E2
      O Na Minha Secreta Área é um espaço de opinião do jornalista Luís Rocha Rodrigues. Nas gavetas, há sempre um bloco de notas e uma caneta para se anotar o futebol.

      As nove notas

      1- Dentro de campo, o título está indiscutivelmente bem entregue. Dois jogos fora de casa mal conseguidos foram a única nódoa num percurso perto da perfeição para a maratona que foi o campeonato. Claro que muitos jogadores revigoraram a sua ação de azul e branco, mas o crédito principal é do treinador e isso é igualmente inquestionável. Os pontos são o que são e este FC Porto foi de uma distância para os rivais na medida certa em que se traduzem os sete e 10 pontos de avanço . Pela forma como jogou em praticamente todos os jogos, sem ter a contrariar um antídoto eficaz - talvez o Belenenses tenha sido a exceção - e pela forma como se superiorizou aos rivais nos quatro clássicos. Excetuando os últimos minutos em casa contra o Sporting (em vantagem no marcador) e a primeira parte contida na Luz, foi sempre um FC Porto melhor. Foi, de facto, um título inquestionável.

      2- Foi, porém, um título seriamente ameaçado pela cultura de campeão que se instalou no plantel encarnado nos últimos anos. Sem encantar, mas com a humildade para reconhecer um sistema perto do esgotamento (4x4x2), Rui Vitória revigorou a equipa a tempo de a colocar a lutar pelo título, o que também só foi possível pela saída precoce de todas as outras competições. No aspeto mental, foi um Benfica muito forte, com a agravante de ter resistido aos muitos ataques e suspeitas que sobre o seu brio e a sua legitimidade de vitória recaíram. Conseguiu, a certa altura, disfarçar as más opções de pré-época e os tiros ao lado no plantel (André Moreira, Pedro Pereira, Hermes, Seferovic ou o bombeiro improvisado Svilar). Mas sucumbiu quando estava perto, muito perto de ter sucesso outra vez. Rui Vitória foi muito (mas muito mesmo) mais vítima do que réu. Teve que reinventar opções, alterar sistemas, “contratar” dentro de portas. Os defeitos do técnico existiram (as substituições previsíveis, a prestação comunicacional em Alvalade), mas as valências foram bem mais. E, como não há todos os anos Edersons, Lindelöfs ou Semedos no Seixal, também não há milagres. Ficou uma época de grande alerta na Luz para os perigos que tão delicada política podem significar. Resta agora perceber se foi um ano de exceção ou se os quatro anteriores é que o foram.

      3- Em Braga e no Bessa foi onde se fez mais com menos. A equipa de Abel mordeu os calcanhares ao pódio e, noutra época, o número de pontos tinha dado para isso. Deu uma grande demonstração de estar muito mais perto dos “três da fuga” do que do “pelotão”. No Bessa, Jorge Simão fez uma valente omelete quase sem ovos. David Simão foi o pêndulo que fez com que tantos pontos fossem amealhados sem grande matéria prima, mas houve uma competência global de um grupo e de um clube que se vai erguendo das cinzas e que “só” precisa de uma maior afluência dos adeptos para se transportar outra vez para as lutas europeias. Apesar de continuar a ser muito delicada a situação financeira, há uma força diferente no reino da pantera.

      4- [Escrito antes da reunião entre Bruno de Carvalho e Jorge Jesus] O Sporting é, a meu ver, a deceção do campeonato. Diria o mesmo se tivesse ficado no segundo lugar. O que, é bom que se sublinhe, não quer dizer que esta tenha sido uma má época. Pelo contrário, mesmo falhado o lugar de possível ida à Champions, se os leões juntarem a Taça de Portugal à Taça CTT, esta época merece um rótulo redondamente positivo. Não há razões para se apontar uma crise desportiva ou algo parecido. Não há mesmo. Só há novamente a apontar uma desnecessária crise estrutural. Sim, a comunicação presidencial, com toda a razão que possa existir, não pode ser feita nos moldes em que é, nos desastrosos timings e na constante postura de birra a que se assiste. Atenção, o Sporting vendeu Moutinho ao FC Porto por 11M€. Onze milhões de euros! Como é mesmo? Com Bruno de Carvalho, os desastres de gestão financeira diminuíram consideravelmente e isto deve ser valorizado. Mas como, se tudo se esvazia na comunicação exterior? Que se trate de tudo dentro de portas, dentro de paredes e longe dos holofotes que mais não trazem do que instabilidade. Ora, quanto ao campeonato, com o melhor plantel dos três crónicos candidatos, a nota artística foi-se e chegou o cinismo à italiana. Muitos jogos ganhos no fio da navalha, superioridade vista mais nas exibições defensivas do que nos resultados, dependência progressiva de Bruno e Gelson, falta de ideias e de dinâmicas. Uma equipa de muito que fez, no campeonato, pouco. E que tinha uma das maiores oportunidades da década para ser campeã.

      5- Bruno Fernandes é um regalo. A classificação talvez o prejudique, porque foi provavelmente o melhor jogador do campeonato, num ombro a ombro com Jonas. Não me lembro de um jogador preponderante e a sair por milhões (Adrien) em Portugal ter sido tão eficazmente substituído nos últimos tempos. Mérito do treinador e sobretudo do próprio, que é um talento brutal para o campeonato português. Que por cá fique, como Casillas, Jonas, Brahimi, Gelson e por aí fora.

      6- O Rio Ave mereceu o prémio do arrojo. Merece, não. Teve-o. Que o quinto lugar é a prova de que vale a pena ser arrojado, atrevido, inovador. Miguel Cardoso foi a maior surpresa da época em Portugal e carregou todos esses condimentos consigo num contexto complicado e arriscado, num clube cada vez mais consolidado no panorama nacional, mas que vendeu, no verão e no inverno, condicionando o rendimento da equipa. Que jogador não se valorizou em Vila do Conde esta época? Quase não haver resposta para esta pergunta, juntamente com o quinto lugar, são aspetos que entram para a primeira página do CV de Miguel Cardoso. A ter em atenção.

      7- A estabilidade começa no banco e por aí se explicam as boas épocas de Portimonense e Tondela. Vítor Oliveira tratou de apagar um fantasma que sobre si recaía pelo muito sucesso na segunda e a aversão à primeira, ganhou a aposta e lançou uma série de bons talentos. Pepa soube perfeitamente o que fazer num Tondela que deixou de ser dos milagres e passou a ser de consolidação. A dar passos seguros no panorama nacional, o ex-avançado teve no regresso à Luz o ponto mais alto, apagou igualmente o fantasma que ligava os beirões ao Benfica e voltou a ser dos mais equilibrados no discurso. Ah, e por falar em estabilidade, parece-me que o Feirense só se manteve (mesmo com muito menos brilho que na época passada) porque não cedeu ao instinto implementado no futebol português e segurou Nuno Manta, que por sua vez segurou o plantel e a manutenção.

      8- Desiludiu-me o Vitória SC. Um clube que, mesmo dando passos interessantes para a consolidação financeira, teve uma oportunidade perdida para mostrar a continuidade cimeira que tanto falta aos clubes abaixo dos quatro do costume. Guimarães é uma enorme potência, a erupção que se vive no estádio é singular e há boas perspetivas de forma faseada, mas que caem por ainda não se saber lidar com a pressão de forma ininterrupta. E também se marcou passo porque, muito mais do que a campanha europeia (as prestações de Marselha e Salzburgo explicam que o grupo era mesmo uma missão quase impossível), se voltou a atuar de forma tardia e pouco feliz num contexto de mercado de verão favorável.

      9- Os amarelos brincaram com o fogo. É a leitura possível para as descidas de Estoril e Paços de Ferreira, dois clubes que muito dificilmente alguém apontaria como relegados quando a época começou. A sede de vender na Linha e o mau cálculo em relação aos treinadores (escolhas e timings) em Paços explicam muito do insucesso de dois clubes com projetos interessantes e que têm um duro revés na procura da afirmação nacional. Acredito num regresso rápido dos pacenses, tenho mais dúvidas quanto ao Estoril, mas nada me surpreenderia se os dois voltassem daqui a uns... 365 dias.

      E os três pedidos

      1- Que se acabe com os empréstimos na mesma competição. Já o escrevi há muito tempo, antes ainda de tal ser abordado pelo G-15. A tendência em Portugal está a ser crescente para encontrar aí mais soluções de rentabilização de dezenas de ativos, mas a verdade desportiva fica seriamente ameaçada. Disparidade entre clubes seria maior? Não, porque os clubes com mais capacidade iam deixar de ter tantos jogadores (por não terem tanto onde colocar) e a valorização que os clubes fazem dos ativos seria incomparavelmente maior, logo a possibilidade de encaixar bons montantes aumentaria consideravelmente. Como não há bom senso nem meios termos, acabar com os empréstimos parece-me boa solução (entre clubes da mesma competição).

      2- Que se volte à prática de não se noticiar denúncias anónimas.

      3- Que se atue, sem complacências, na justiça. Desportiva e civil. Que se possa aplicar a transparência que tanto falta, no futebol turvo, de suspeita constante e de acusação fácil. Será possível?

      Venha de lá esse Mundial!



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